Estudo sugere que biodiversidade urbana equivale
a entre 8% e 25% da encontrada em habitats naturais; especialistas defendem
preservação de áreas verdes para aumentar número de espécies e melhorar
bem-estar humano.
Nos últimos séculos, o ser humano se tornou cada vez mais urbano,
e esse processo tem tido um impacto inegável sobre a natureza: o
desenvolvimento de cidades repletas de concreto, asfalto e indústrias poluentes
causou grandes perdas à biodiversidade, sobretudo no entorno de grandes
congregações populacionais. Mas um novo estudo afirma
que um número relativamente alto de espécies continua a sobreviver nas cidades,
e mais ainda podem se desenvolver se houver esforços de conservação de áreas
verdes urbanas.
A pesquisa indica que, ao contrário do que se pensa, os centros
urbanos não são locais ‘inférteis’ para a biodiversidade. No total, foram
analisadas 147 cidades – em 54 foram avaliadas espécies de aves e, em 110, de
vegetais – e descobriu-se que, em média, 8% das espécies de aves e 25% das
espécies de plantas das regiões examinadas sobrevivem à urbanização do local.
O estudo, publicado pelos periódicos Proceedings B e Nature,
aponta também que, enquanto algumas espécies, como pombos e a gramínea Poa
annua, são encontradas em várias cidades, a maioria das espécies ‘urbanas’
reflete a herança da biodiversidade de determinada região geográfica. Isso
significa que uma porcentagem das espécies nativas continua a sobreviver depois
da urbanização.
“As cidades e áreas urbanas não são tão desprovidas de
biodiversidade como podemos pensar. Nossas descobertas indicam que as cidades
oferecem habitat para uma série de plantas e animais”, observou Chris Lepczyk,
professor do Departamento de Recursos Naturais e Gestão Ambiental da Universidade
do Havaí em Manoa.
“Isso é importante porque a maioria das pessoas ao redor do mundo
vive em áreas urbanas, e então a biodiversidade em cidades é essencial para as
pessoas terem uma conexão direta com a natureza”, acrescentou Lepczyk.
Infelizmente, os resultados da pesquisa sugerem que, embora essa
biodiversidade urbana seja maior do que se esperava, ela ainda é muito pequena
se comprada à biodiversidade presente no meio natural.
Por isso, a análise ressalta o valor de espaços verdes nas
cidades, alegando que eles se tornaram refúgios importantes para as espécies
nativas e também para as que migraram posteriormente para a região.
Esse fenômeno de agregação da biodiversidade em áreas urbanas é
chamado de Efeito Central Park, por causa do grande número de espécies que é
encontrado no parque nova-iorquino, uma ilha verde dentro de Manhattan.
“Embora a urbanização tenha feito as cidades perderem grandes
quantidades de plantas e animais, a boa notícia é que as cidades ainda mantêm
espécies endêmicas nativas, o que abre a porta para novas políticas sobre a
conservação regional e global da biodiversidade”, comentou Myla F.J. Aronson,
pesquisadora do Departamento de Ecologia, Evolução e Recursos Naturais da
Universidade Estadual de Rutgers, em Nova Jérsei.
De fato, conservar espaços verdes, restaurar espécies de plantas
nativas e criar habitats que respeitem a biodiversidade dentro do espaço urbano
poderia estimular uma maior biodiversidade nas cidades. E segundo um estudo
feito recentemente em espaços verdes em Sheffield, na Inglaterra, uma maior
biodiversidade pode inclusive melhorar o bem-estar psicológico dos habitantes
de uma cidade.
“É
verdade que as cidades já perderam uma grande proporção da biodiversidade de
sua região. Isso pode ser um cenário de um copo meio cheio ou meio vazio. Se
agirmos agora e repensarmos o desenho de nossas paisagens urbanas, as cidades
podem ter um grande papel na conservação de espécies vegetais e animais e
ajudar a trazer de volta mais deles”, declarou Madhusudan Katti, membro do
departamento de biologia da Universidade Estadual da Califórnia em Fresno.
Felizmente, há alguns exemplos de cidades que contam com uma rica
biodiversidade. A maioria delas apresenta áreas verdes urbanas de grande
extensão, como no caso do Central Park em Nova Iorque, ou até mesmo têm
proximidade com um parque nacional ou outro tipo de área protegida, como
Nairóbi, no Quênia, cujo parque nacional fica há apenas alguns quilômetros da
cidade, o que resulta em mais de 300 espécies de aves no município.
Além disso, a última década apresentou alguns marcos
significativos em busca de uma maior biodiversidade nas cidades. Em 2006,
alguns governos municipais pioneiros, de Curitiba a Joondalup, na Austrália,
criaram o Ação Local pela Biodiversidade, programa que visa melhorar e reforçar
a gestão ecossistêmica em nível local.
No caso de Curitiba, o programa BioCidade colocou
como objetivo: reintroduzir espécies de plantas ornamentais nativas da cidade,
estabelecer unidades de conservação com a participação da sociedade, preservar
os recursos hídricos, plantar espécies nativas de árvores, e melhorar a
qualidade do ar, a mobilidade e o transporte através de um projeto que visa à
criação de corredores de transporte com faixas especiais para ciclistas e
pedestres.
“A mensagem chave desse trabalho é muito simples. A proteção dos
espaços verdes existentes e a criação de novos habitats são essenciais para
apoiar a vida selvagem nas cidades. Como podemos realmente fazer isso é mais
difícil, e exigirá a colaboração entre cientistas, planejadores urbanos e
gestores de habitat”, concluiu Mark Goddard, biólogo da Universidade de Leeds e
um dos autores da pesquisa.
Crédito imagens: Aves muitas vezes conseguem continuar habitando
as áreas urbanas / Wikimedia CommonsPrograma BioCidade / Prefeitura de Curitiba
Fonte: Instituto Carbono Brasil