A triste conclusão de que as
nossas florestas, além de estarem em um processo contínuo de desmatamento,
estão vazias, cada vez mais depauperadas da vida que as constitui, é o foco de
uma série especial da revista Science.
A publicação chama a atenção para um termo que
deve se tornar cada vez mais conhecido, a ‘defaunação’: a atual biodiversidade
animal, produto de 3,5 bilhões de anos de evolução, apesar da extrema riqueza,
está decaindo em níveis que podem estar alcançando um ponto sem volta.
Segundo cientistas, tal perda parece estar
contribuindo com o que classificam como o início do sexto evento de extinção
biológica em massa – ao contrário dos outros, que tiveram causas naturais, nós
seríamos os culpados, devido às chamadas atividades antrópicas.
“Muito permanece desconhecido sobre a
'defaunação do antropoceno'; essas brechas no conhecimento prejudicam a nossa
capacidade de prever e limitar os seus impactos. Porém, claramente, a
defaunação é tanto um componente perverso da sexta extinção em massa do planeta
quanto uma grande causadora da mudança ecológica global”, concluíram
pesquisadores no artigo 'Defaunação
no Antropoceno'.
Na abertura da revista, um dos editores, Sacha
Vignieri, lembra que, há alguns milhares de anos, o planeta servia de lar para
espetaculares animais de grande porte, como mamutes, tartarugas gigantes,
tigres-dente-de-sabre, entre outros.
Porém, evidências apontam o ser humano como o
grande culpado pelo desaparecimento desses animais, afirma o editor.
E infelizmente, a tendência parece longe de
mudar, e com ela, toda uma série de funções dos ecossistemas, das quais depende
a nossa vida, são alteradas de formas dramáticas.
Como mostram os artigos na Science, os impactos
da perda da fauna vão desde o empobrecimento da cobertura vegetal até a redução
na produção agrícola devido à falta de polinizadores, passando pelo aumento de
doenças, a erosão do solo, os impactos na qualidade da água, entre outros. Ou
seja, os efeitos da perda de uma única espécie são sistêmicos.
Números
De acordo com o estudo 'Defaunação
no Antropoceno', as populações
de vertebrados declinaram em uma média de mais de um quarto nos últimos
quarenta anos. Isso fica extremamente evidente quando qualquer um de nós
caminha nos remanescentes de Mata Atlântica: é realmente muito difícil
encontrar animais de médio e grande portes.
Se a situação é complicada para os vertebrados,
que são muito mais conhecidos, é angustiante imaginar o tamanho da crise para
os invertebrados, como os insetos, muito menos estudados.
"Apesar de menos de 1% das 1,4 milhão de
espécies de invertebrados descritas terem sido avaliadas quanto à ameaça pela
IUCN, das analisadas, cerca de 40% são consideradas ameaçadas”, afirma o
estudo.
Solução?
Certamente, a resolução dessa crise do
Antropoceno não é simples.
As causas dessas perdas são bem conhecidas –
caça, fragmentação dos habitats, uso de agrotóxicos, poluição, etc. –, e as
tentativas para reverter essas tendências estão aumentando, como a reintrodução
da fauna.
No artigo ‘Revertendo
a defaunação: restaurando espécies em um mundo mutante’, pesquisadores revisam uma série de translocações
conservacionistas, como o reforço, a reintrodução e métodos mais controversos
que buscam restaurar populações fora do seu habitat natural ou substituir
espécies extintas.
Os autores escrevem que a meta mais tradicional, de ter populações
selvagens autosustentadas em paisagens pristinas intocadas pela influência
humana, é “cada vez mais inalcançável”. Assim, eles sugerem que criar a
“selva”, em vez de restaurá-la, é o caminho mais prático para avançar.
Entretanto, os desafios para reverter as
extinções estão se mostrando muito desafiadores, e as pesquisas atuais mostram
que, “se não conseguirmos acabar ou reverter as taxas dessas perdas,
significará mais para o nosso futuro do apenas que corações desiludidos ou uma
floresta vazia”, disse Vignieri, o editor do especial na Science.
Rodolfo Dirzo, professor da Universidade de
Stanford – um dos autores de Defaunação no Antropoceno –, argumenta que reduzir imediatamente as taxas de alteração
dos habitats e a sobre-exploração ajudaria, mas que isso precisaria ser feito
de acordo com as características de cada região e situação.
Ele espera que a sensibilização sobre a atual
extinção em massa e suas consequências ajude a desencadear mudanças.
“Os animais importam para as pessoas, mas no
equilíbrio, eles importam menos do que a alimentação, emprego, energia,
dinheiro e desenvolvimento. Enquanto continuarmos a enxergar os animais nos
ecossistemas como tão irrelevantes para essas necessidades básicas, os animais
perderão”, disseram Joshua Tewksbury e Haldre Rogers no artigo “Um futuro
rico em animais”.
Crédito das imagens: Revista Science; Fabricio Basilio
Fonte: Instituto Carbono Brasil