Maior relatório já realizado sobre a contribuição da atividade para o aquecimento global conclui que a popularização de melhores práticas e tecnologias seria o suficiente para cortar drasticamente a liberação de gases do efeito estufa.
A pecuária é responsável por emitir anualmente 7,1 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e), cerca de 14,5% de toda a liberação de gases do efeito estufa (GEEs) resultante das atividades humanas. Em alguns países, como no Brasil, o setor e as mudanças do uso da terra provocadas por ele e pela agricultura são o principal contribuinte para as emissões nacionais.
Por isso, o novo relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) merece ser saudado por esclarecer que é possível reduzir as emissões da pecuária sem diminuir a produção de alimentos.
“Tackling climate change through livestock: A global assessment of emissions and mitigation opportunities” (algo como Lidando com a mudança climática através da pecuária: uma avaliação global das emissões e oportunidades de mitigação), divulgado nesta semana, está sendo apresentado pela FAO como “a mais abrangente estimativa já feita sobre a contribuição da pecuária para o aquecimento global – assim como do potencial do setor para lidar com o problema.”
A principal mensagem do documento é que, se as melhores tecnologias e práticas já existentes fossem implementadas em escala mundial, seria possível reduzir em até 30% as emissões da pecuária.
“Sabemos, já há muitos anos, que a cadeia produtiva da pecuária é um importante contribuinte para as mudanças climáticas. Esse relatório mostra que reduzir significantemente as emissões do setor está a nosso alcance. Opções estão disponíveis para todas as espécies, sistemas e regiões. O que precisamos é de vontade política e de melhores regras”, afirma Ren Wang, diretor-geral assistente da FAO para Agricultura e Proteção ao Consumidor.
De acordo com o relatório, as principais fontes de emissões da pecuária são: produção de alimentos para os aniamis (transformação de áreas intocadas para pastagens) e processamento (45%), liberação de GEEs durante o processo digestivo do gado (39%), decomposição dos resíduos (10%). A porcentagem restante é proveniente do transporte dos animais e do processamento industrial da carne.
Detalhando dessa forma, a FAO foi capaz de analisar os impactos de tecnologias já existentes na quantidade de emissões de cada etapa da cadeia produtiva da pecuária.
Por exemplo, para o modelo sul-americano de produção de carne, com vastas extensões de terras sendo utilizadas, a melhoria da qualidade de pastagem e da forma como ela é mantida faria uma grande diferença. O relatório estima que seria possível reduzir as emissões do setor no continente entre 19% a 30% apenas com essas medidas.
Já para os produtores de laticínios nos países desenvolvidos, o ideal seria investir em eficiência energética dos equipamentos e práticas modernas de alimentação dos animais.
A FAO destaca que esse tipo de inovação não apenas reduziria as emissões, mas aumentaria a produção de alimentos. Além disso, nenhuma das sugestões é irreal, uma vez que na verdade o que o relatório recomenda é a popularização das tecnologias e metodologias já sendo utilizadas nas melhores propriedades.
Nesse sentido, aparecem no relatório as Ações Nacionais de Mitigação Apropriadas (NAMAs) como uma das formas para alcançar essa massificação. As NAMAs são intervenções do setor público para mobilizar a participação privada no desenvolvimento de baixo carbono e podem variar desde estratégias multissetoriais com instrumentos políticos específicos até projetos piloto únicos.
Brasil
Um relatório sobre emissões da pecuária não poderia deixar de fora o país com maior rebanho comercial de bovinos do mundo, com aproximadamente 209 milhões de cabeças.
O Brasil recebe destaque justamente por suas NAMAs, em especial o Programa de Agricultura de Baixo Carbono (ABC). O país assumiu uma série de compromissos com esse plano, como a redução de 6,9 milhões de toneladas de CO2e até 2020 com o desmatamento evitado e com melhores práticas para a agropecuária.
O Programa ABC possui um orçamento estimado de R$ 197 bilhões e oferece linhas de créditos com taxas abaixo do mercado para financiar a adoção de novas tecnologias que resultem em ganhos ambientais e energéticos.
De acordo com a FAO, o Brasil é um exemplo por conseguir aumentar o rebanho ao mesmo tempo em que conseguiu reduzir o desmatamento (veja gráfico abaixo).
Iniciativa Privada
O relatório destaca que a transformação na pecuária mundial só pode acontecer com o engajamento dos setores empresariais, em especial das grandes cadeias de distribuidores.
Felizmente, a FAO aponta que já existem várias iniciativas nesse sentido. Uma delas aqui mesmo no Brasil.
A parceria firmada entre a Marfrig, a segunda maior empresa processadora de carne bovina do país, o Walmart e a organização não governamental The Nature Conservancy tem como objetivo melhorar a sustentabilidade da produção de carne na região de São Félix do Xingu, no Pará.
O documento afirma que esse tipo de acordo está ficando mais comum, até por causa da pressão dos consumidores, que começam a exigir produtos que não sejam resultado do desmatamento da Amazônia, por exemplo.
A FAO conclui que para colocar a pecuária em um caminho alternativo serão necessários esforços conjuntos de vários atores.“Apenas se todos se envolverem – os setores público e privado, a sociedade civil, a academia e organizações internacionais – será possível implementar as soluções que cubram toda a diversidade e complexidade da pecuária”, declarou Wang.
Fonte: CarbonoBrasil.